terça-feira

Neto de Capela e Silva PROVA Plágio!

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Àcerca do livro "Motivos Alentejanos"
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Quando Marcei Duchamp, em 1919, desenha um bigode e uma barbicha na Gioconda de Leonardo da Vinci, está a servirse de um dos maiores ícones da arte ocidental para um acto de criatividade. Sim! Criatividade! Poia até aí ninguém se tinha lembrado, pelo menos publicamente, de tais postiços nessa enigmática figura. Goste-se ou não, uma coisa é certa, não passou despercebido. Mas essa era certamente a sua intenção: não passar despercebido e, acima de tudo, provocar. Mostrou, mostrou-se e não escondeu. Ademais, escancarou as portas para uma reflexão sobre os limites do que é ou não é uma obra de arte.

Mas vem tudo isto a que propósito? Perguntarão os leitores. Pois bem, permitam-me que conte uma breve história.

Foi pelo ano de 1986, penso eu, que ao passear pela Baixa Lisboeta vi num escaparate de uma livraria uma obra intitulada Motivos Alentejanos. O nome do autor era-me completamente estranho, mas o gosto pelos temas alentejanos levou-me à sua aquisição. Ao folheá-la, para uma leitura rápida de primeiras impressões, deparei-me com qualquer coisa que já conhecia. Chegado a casa deitei mão ao livro Ganharias e, espanto meu, lá estava... E o espanto aumentava quando, procurando com mais cuidado, ia encontrando mais semelhanças. Tinha então em mãos uma obra que reproduzia passagens de uma outra publicada em 1939 e escrita por meu avô, José Alves Capela e Silva. Procurei se o autor lhe fazia qualquer referência: numa nota de rodapé, numa qualquer bibliografia, num prefácio, fosse onde fosse. Nada. Conclusão: o nome tinha sido escondido, deliberadamente ignorado.

Podia ter denunciado o caso nessa altura. Não o fiz. Sinceramente hoje já não sei bem porquê. Calmamente todo o incómodo que essa situação me tinha causado foi-se desvanecendo. Deixei o livro Motivos Alentejanos na prateleira e, ironiadas ironias, em boa companhia; Ganharias, A Linguagem Rústica no Concelho de Elvas, Memórias Alentejanas, todos de J. A. Capela e Silva; Através dos Campos, de José da Silva Picão e tantos outros de Eurico Gama, António Tomás Pires, Domingos Lavadinho, Alexandre de Carvalho Costa, etc. Nomes e obras incontornáveis para quem se dedica aos estudos e investigações sobre o Alto Alentejo. Estavam as emoções já quase arrefecidas quando, em Nisa, numa tarde qualquer, venho a travar conhecimento com o autor da referida obra. Recordo-me bem que depois do primeiro cumprimento me disse, de forma fácil e rápida, o seguinte: Conheço bem a obra do seu avô e aprecio-a bastante. Aquelas palavras soaram-me mal. E procurei rapidamente uma forma simpática, o que se afigurava difícil, de me afastar dali. Podia ter esclarecido toda a embrulhada naquele momento? Talvez. Mas o ânimo fervia... Que descaramento!

Passaram-se, desde então, vinte e três anos. Há dias, quando foi dada publicidade à reedição da obra de Ribeirinho Leal disse a mim mesmo: chega, duas vezes é demais. Mas esperei até ter em mãos a segunda edição. E, permitam-me a expressão, foi pior a emenda que o soneto. Depois de comparar a edição agora dada à estampa com a primitiva, verifico que há uma referenda a Capela e Silva e outra a Capelo e Silva (sic) (página 36 e página 56 respectivamente). Na verdade é uma alteração relativamente à edição de 1982, mas que na substância não altera o que se desejaria ver esclarecido e a limpo. Porquê? Porque Ribeirinho Leal afirma (página 36) como nos descreve Capela e Silva e não é desse modo que Capela e Silva descreveo fabrico do queijo (ver Ganharias, páginas 120 a 122 ). Se a descrição citada pretendia traduzir o que está na obra Ganharias, e apenas isso, então não se alterava o tempo dos verbos, a pontuação, o vocabulário, a grafia e o itálico. Na segunda referência, onde diz pora citar novamente Capelo e Silva (sic) o caso parece-me mais grave. O que está a citar? Uma frase, duas, três, quantas? O método é o mesmo: muda-se o tempo dos verbos, tiram-se palavras e colocam-se outras, e chama-se a isto citar.

Escrevia já eu estas linhas quando, na imprensa local, foram feitas algumas referências ao lançamento da obra de Ribeirinho Leal, no dia 3 de Junho no semanário Alto Alentejo e no dia 4 no semanário Distrito de Portalegre. Do primeiro transcrevo uma passagem que me parece curiosa, quando o autor diz, a respeito do seu livro, o seguinte; Fi-lo o partir de conhecimentos da realidade da nossa província, do contacto com pessoas que viveram o Alentejo de outros tempos e através dos escritos que nos foram legados, como os do Conde de Monsaraz, de António Sardinha, de Maria Transmontano e de José Alves Capela e Silva. Afinal, algo de bem diferente daquilo que consta no prólogo da obra (quer em 1982, quer em 2009). Acto de arrependimento? Compare-se e tirem-se as conclusões.

Mas foi no semanário Distrito de Portalegre que encontrei aquilo que, não fosse o caso de estarmos perante algo melindroso, me faria rir. Ainda bem que esperei! Desde já desejo que fique bem claro o seguinte: não me revejo nos textos, quer anónimos ou não, que têm aparecido em diversos blogues a respeito deste assunto (há mesmo um texto que refere Marcei Duchamp, como aqui eu o fiz no começo, o que poderia levar a pensar ser eu o seu autor), como se pode constatar escolhi outro meio; como também não alinho no coro das vozes que dizem que a obra de Ribeirinho Leal é plágio de uma outra (há passagens que são realmente plágio, mas não toda a obra).
No artigo do semanário acima referido é dito o seguinte: confrontado com as acusações do blog, o autor afirmou que "em todas as passagens retiradas do livro Ganharias" teve sempre a "preocupação" de colocar "aspas" e que em todas as passagens citadas o autor é referido, e que só por falha tipográfica, na primeira edição, o autor, Capela e Silva, não apareceu citado na bibliografia final, facto que está corrigido nesta segunda edição. Agora é que não percebo bem, entrámos no domínio do misterioso e do parapsicológico? Bibliografia? Onde está? Na primeira edição, pelos vistos foi por falha tipográfica (sic) o nome de Capela e Silva não ter aparecido ao lado dos outros que, curiosamente também lá não estão! Francamente! O livro não tem qualquer bibliografia! Melhor ainda, o facto foi corrigido nesta segunda edição. O mistério engrossa... desapareceu a tal bibliografia... e o livro continuasem tal complemento. Mas que se pretende com tal tipo de afirmações? Querem-nos tomar por mentecaptos? Mas há mais. Diz Ribeirinho Leal que teve sempre a "preocupação" de colocar "aspas" quando, pelos vistos, fizesse qualquer citação. Isto é falso: como é que se explica que apareçam frases na obra Motivos Alentejanos que são transcrições das Ganharias, sem quaisquer aspas?
Exemplos: conferir páginas 55 e 56 da 1ª edição e página 43 da 2ª edição dos Motivos Alentejanos com a página 48 das Ganharias; conferir página 57 da 1ª edição e página 44 da 1ª edição com a página 85 das Ganharias; conferir páginas 69 e 70 da 1ª edição e página 55 da 2ª edição com as páginas 169, 170, 174 e 175 das Ganharias. Em suma, para todos estes casos não sobraram aspas.
Depois há os casos com aspas sem a indicação do autor: conferir páginas 47 e 48 da 1ª edição e páginas 35 e 36 da 2ª edição (aqui já com a indicação do nome de Capela e Silva, como referido anteriormente) com as páginas 120 a 122 das Ganharias; conferir página 66 da 1ª edição e páginas 52 e 53 da 2ª edição com as páginas 133, 134 e 139 das Ganharias; conferir página 67 da 1ª edição e páginas 53 e 54 da 2ª edição com as páginas 143 e 149 das Ganharias; conferir página 70 da 1ª edição e página 56 da 2ª edição (também aqui já com a indicação do nome de Capelo e Silva (sic), como referido anteriormente) com as páginas 187 e 192 das Ganharias; conferir página 74 da 1ª edição e páginas 59 e 60 da 2ª edição com as páginas 223 a 225 das Ganharias (aqui até se troca um vocábulo usado por Capela e Silva, rolheiro, por outro, rilheiro).
Apenas me referi a factos sem querer entrar em especulações fáceis, que as podia fazer relativamente a outras passagens mas, como diz o lugar comum, os factos falam por si.

Do atrás exposto ficamos com a sensação que não houve qualquer critério para, supostamente, citar um autor e uma obra. Ou será que colocar aspas a torto e a direito dá qualquer garantia e é critério suficiente para salvaguardar a seriedade e sinceridade de quem escreve? Se, por exemplo, Ribeirinho Leal cita e identifica uma autora e a obra (ver página 53 da 1ª edição e página 41 da 2ª edição dos Motivos Alentejanos), porque razão não fez o mesmo com a obra e o nome de Capelae Silva? Se as aspas, só por si chegam, quem está Ribeirinho Leal a citar nas páginas 96 e 97 da 1ª edição e nas páginas 79 e 80 da sua obra? Outra vítima das falhas tipográficas?
Se tivesse existido um critério cuidado, atento e assente em princípios minimamente académicos, não se chegaria ao ponto de fazer uma citação (?) como aquela que ocorre na página 101 da 1ª edição dos Motivos Alentejanos (página 83 da 2ª edição) onde se refere uma obra de Carlos Bento da Maia, Tratado de Cozinha e Sopa que, na verdade, se intitula Tratado de Cozinha e Copa, publicada nos princípios do século vinte e com outras edições bem mais próximas de nós. Curiosamente, esta imprecisão também aparece numa outra obra de Ribeirinho Leal, Achegas para a Monografia de Cabeço de Vide (2ª edição, página 125), onde o autor faz a mesmíssima citação (?).

Depois disto não se pense que é minha intenção (nem dos outros descendentes de José Alves Capela e Silva: o meu pai, a minha tia, o meu irmão e os meus primos) mover qualquer processo à pessoa do senhor João Ribeirinho Leal. Não se pretende qualquer ganho ou benefício. Apenas desejo (desejamos) um pedido público de desculpas por parte de quem usou algo que não lhe pertencia: tal como Duchamp, mostrou e mostrou-se ... mas neste caso, escondeu.

No entanto, e no meio desta trapalhada, tenho que agradecer ao senhor Ribeirinho Leal a oportunidade que proporcionou, se bem que não pelos melhores motivos, ao evitar que, para já - e peço emprestadas algumas palavras do Prólogo do livro Motivos Alentejanos - o tempo, no seu radar incessante e por vezes louco, não se encarregasse de (...) sepultar no Mausoléu do Esquecimento a obra e o nome de José Alves Capela e Silva. Aliás, penso que uma segunda edição das Ganharias seria oportuna. Vamos pensar, eu e os outros Capela e Silva, nessa possibilidade.
Para mim, chega de plágio e ex-citações.
José Luís Salvado Capela e Silva
Nisa, 6 de Junho
FONTE: Alto Alentejo

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